vida maré

penso na vida
como quem olha
o mar

a onda vai, não vem
a onda se rebenta prenha de grãos

eles se movem
geram atrito
estruturam paredes de castelos
e sujam biquínis tímidos
sem saber da primeira gota
que os tornou outros

depois outra
depois outra
depois outra

observo
reencarnações marítimas
dobrando sobre a costa
enquanto espero meu quebra-mar

desmame

uma casa de paredes largas
tijolos guardando memórias
do cárcere dela
isolada de tudo
principalmente
de mim

a janela que limita
a vista do vasto pasto
onde a cerca delimita
as memórias bovinas
separadas de tudo
inclusive
de si

não domir
porque sonhos embalados assim
são saudades insones

brotam,
mugidos e lágrimas,
arrebatam durezas
as texturas das buscas
pelo que já não há
aqui

crepúsculo

no fim
toda chance
se tornará natureza

fim

a terra
seguirá
as partículas
seguirão

a memória
aventura-se
em não ser
nem carbono
nem nada

uma variável
longínqua
numa teoria do caos
não matemática
não unitária
naturalmente
inválida

nova era

a nova era
ia e vinha
ontem
hoje
já era
e vai e vem

o velho conservador
de orgulho atento
feito joguete de ioiô
clama um verno tempo
  de foguetes
  de tédios
  de ignorâncias
  de sangues
de tudo
em nome de si