Tanque da Cozinha
os olhos são os primeiros a entregar
semicerrados
inchados
vermelhos
perdidos.
tentando buscar uma luz de lembrança,
querendo encontrar um detalhe
para diminuir sua culpa.
os músculos cansados
guiam o corpo para o tanque
onde esperam trabalhar incansavelmente,
somente para apagar provas que desconhecem...
um pouco de sabão,
um tanto de água
e muito enxaguar...
aos poucos, surgem as primeiras bolhas.
carregam o cheiro, o tato, o beijo, a trama, a transa.
e assim, a noite ébria se faz presente
como quem quer ser esquecida.
mais fortes que na camisa,
estão as marcas na memória:
você, solto, leve e em casa;
ela, solta, leve e longe de casa.
fusão de semelhanças e diferenças em gozo.
esfrega pano contra pano com mais força.
no desespero, sangram-lhe as mãos
dar cor vermelha do batom
que assina seu pescoço.
sangue que mancha o roxo do tecido,
das pequenas hemorragias propositais
tatuagens removíveis.
no cabelo desgrenhado ainda está o cheiro,
cigarro do depois.
na respiração, o suspiro de uma noite
muito mal dormida
no coração, um misto de culpa
com utopia...
no coração, uma linda utopia...
no coração, um coração limpo.