desencontro

minha poesia
  muda
acorda cedo

faz uns ovos mexidos
duas torradas
um chá

admira o dia
  ainda existindo

  respira fundo
  e faz uma sóbria pausa

até eu acordar

berlim

creio-me conjurando
magos de frágeis crenças
na mesa
ou foto
pontos distantes
perdidos
fora de foco

sigo reivindicando
todas minhas ausências
de lar,
de cá
de uma vaga ideia
do que tenha sido
um dia
lugar

amañanarse

verbo intransitivo

  reflexivo o reflejado,
  me encontro
  num par de olhos cerrados

ou que também significa

  llenarse de manha
  principalmente
  por las mañanas

grullas

ignorando o chão
  mirávamos
sempre para cima
  a apostar
até também nos tornarmos
resíduos de querosene

pálidas cicatrizes brancas
  um corte no azul
    dois cortes
  um novo tipo de céu
      afetado
por futuros
      até então
            ignorados

        pisco

quebro um dedo
perco um dente
rasgo um talo
e a vida passa

teimosa e graciosa
como um par ou
um casal de garças

    plainando

por todo o resto
do que sobrou ou
daquilo que creem ver

lugares

amigo,
tamos há muito tempo separados
  cada um de nós tem um destino

o tempo, quanto mais passa,
mais tornamos definidas
  nossas medidas
  nossas verdades
  nossas maldades
    nossas casas

sinto falta de sentir que sou restrito
que sou descrito nos lugares onde estou

mas somos tanto

voltemos para quando havia sentido
pra quando ainda éramos formato

quando toda palavra era canto