quarta-feira de cinzas

o homem do saco
roubou
toda minha vontade de conhecer
o mundo
agradeci-o com um café
ainda com a lembrança
dos teus olhos fortes

devia ter ouvido minha avó sobre
os casacos
atentado para suas crenças e folclores
perigos e alertas
sobre o homem do saco
e essas mulheres
munidas de olhares fortes

there there

me evita como
  quem evita um carinho

  como quem se conforma
            se deprime

- o mundo é esse e
  não tem mais volta

você não -
  me quer
  e eu te amo

Hortinha

Escrevi teu nome
num grão de arroz.
Plantei teu nome
no pote de algodão,
juntinho do meu
num grão de feijão
para vingarmos juntos,
saciar essa fome
grande da saudade
de sermos nós mesmos.

anônimo

minha voz mais forte
soa dentro de mim

por mais que eu grite
ocupo tão pouco espaço

queimo menos que
a chama que esquenta
meu almoço

o que sou pros outros
só importa
    a mim
    não me importa
    nada

por ser muitos não
sou ninguém

heterônimo

quem é esse
que vive minha vida em piloto automático?

que não tem consciência ou memória
há tantos anos
me sinto

    de repente
tão cheio de culpa
          de tristeza

se é esse quem eu sou
quem é esse
    que assina meus papéis
        se finge de feliz

    que engana a todos
        fecha meus olhos
        e me tortura

        ao deixar que eu viva
        três horas
        da madrugada