entre quatro paredes

queria dormir
na sua cama
esta noite

não quero
nada não
    nem esquemas
    nem holofotes
    nem segredos

só quero o quase-ver do seu sorriso
sabendo que ele existe nesse vulto
e está guardado em mim e em seus lençóis.

My Favourite Things

Buceta. cú, bunda e peitos de mina, café, violino, acordeon, tango, gypsy jazz, fanfarras, cigarros, pós foda boa, cerveja, demoiselle da colorado, viajar pelo mundo, fuder, dormir à base de remédios, andar sem rumo, banco de praça ou praia em uma manhã ou entardecer, tomar um avião, mesa de bar, rio de janeiro, boa viagem, parque lage, jardim botanico, independência financeira e sentimental, superar crises, aprender com os erros, compor, programar, familia, amigos, conhecer gente, sartre, yoga, busca pela "verdade", massa, vinho, preacher, true romance, jazz, ficar vegetando com o olhar longe como um autista, mar, árvores, clube da luta, Aleister Crowley, os profetas da humanidade, gatos, animais soltos, road movies, perceber que o que eu achava verdade absolute era pura mentira, saber que as pessoas mudam, alivio da angústia, euforia como anunciação, me drogar como autoconhecimento, querer sempre mais, rejeitar o outro como referencial, Astor Piazzolla, Beirut, Yasunori Mitsuda, Otis Readding, Mr Nobody, gratidão por algum principio que creio me guiar através de erros, admirar belas paisagens e obras de arte, admirar belas paisagens e obras de arte com uma garota, garotas de saia, garotas de cabelo curto, garotas sendo garotas, meu apartamento, café da manhã em um lugar bonito, refinar o gozo, saber que certas coisas são possiveis mesmo não estando ao meu alcance no momento, não me reconhecer a mim mesmo depois de 1 ano ou menos, perseverança, não ter facebook, buenos aires, preto e branco, fugir de tudo quando se é possivel fugir de tudo, sonhos de realizações futuras, morte ao velho e respeito pelo mesmo, ser veículo de mudança e canal do porvir,

desejo de sumir, a destruição da ignorância em mim, o desconhecido

caranguejo

minha língua
minha arma
a parte que mais te convém
te agarra
te fere

chafurdo
no mangue dos pensamentos
crendo-me ardiloso
ao te cobrir com minha lama
enquanto me caçavas
com tuas mãos cegas

mergulhos silenciosos
eu, paralisado

capturado e incapaz
miro com dois olhos
teu caminhar
distante

capturado e incapaz
te miro com dois olhos
de lado
para não perder
a vista do horizonte

duas listras

agora está tudo certo. os contratos assinados, os móveis encomendados, os suores esquecidos. é hora de reduzir o ruído de fora pra dar vez ao que vem de dentro.
nove anos e quatro amores me bastaram para entender a capital. meus primeiros sinais de intolerância, traço característico do meu sangue, se revelam nas músicas que retiro das caixas de papelão.
é pra frente, diz a consciência, com uma bandeja de saudosismos. pra frente, grita, olhando pra trás. meu medo de viver o presente só para o tornar lembrança se confirma cada vez mais - cada vez que visto esse casaco de duas listras.
aos quinze, sem muito dinheiro e noção de moda, eu achava o máximo esse casaco de duas listras. sempre via uma ou três, nunca duas. foram só quarenta reais, eu dizia, sem ideia de quanto custava os adidas dos amigos. cem reais por uma listra a mais, listra que demonstrava algo que eu não sabia o que era: status. listra que, hoje, já não me tem mais valor.
e como a segunda listra que demarca a resistência ao óbvio, essa segunda passagem pelo local da minha juventude me faz renunciar aos velhos hábitos. não há ninguém aqui. ninguém que eu possa dizer que conheço. seus rostos são tão familiares e vazios de conteúdo quanto o que vejo no espelho.
mas o que me fez voltar foi apenas um motivo: essa cidade me permite. esse frio me permite. tudo. e assim como o frio, a cidade e os rostos que reconheço, continuo como sempre estive, eternamente um vulto no canto dos seus olhos.

Já tentei fugir

Já tentei fugir mas não deu

Parecia sonho quando era ainda sonho
onde se queria ir muito longe para encontrar algo,
para realizar a si mesmo em outras terras

Não há outra mentira

Posso ir até a França e a Itália,
Beber chá com Turcos e comer em Bangladesh,
as coisas que precisam ser feitas
continuam aqui
onde eu nasci,
em Niterói

As praças continuam as mesmas
mas ecoam memórias do passado,
Pessoas que eu jurava conhecer muito, hoje me são estranhas,
Quem eu achava que nunca ia dar certo junto,
    provou ser um dos maiores acontecimentos nas últimas semanas

O que me pôs em movimento está aqui

Os espíritos que me moldaram ainda estão vivos,
eles me chama constantemente
como vozes na minha cabeça,
me dizendo para continuar e ao mesmo tempo desistir de vez da vida,

Quem pariu tais seres?

As ruas são as mesmas,
no entanto renovadas pelas lembranças do passado

O que me era desconhecido,
hoje me vem à clara através da prática de um diário

Quem foi eu, me pergunto,
Quem foi e continua sendo este panteão de garotas a me provocar, incitando guerra e esperança em meu coração?

O passado nunca está morto
ele vive em mim,

e fugir,
não mais é uma opção