Por que as águas da minha fonte se escondem?
Distorcem os lapsos de embriaguez?
Sensatez demasiada?
Manada de surdez?
Altivez da pequenez?
Estupidez moderna?
Lanterna ou vela me guiarão nessa caverna?
Morna jornada dirá Platão?
Dirão o que os outros sábios?
Lábios te darão as respostas?
Costas que caminham podem rimar?
Por que nada vai além?
tem onde não cai?
Sai de quem as ciladas?
Por que a alma beija seu espelho enquanto corre?
Escorre o seio vagando no museu da calma?
Ama o espanto que só escreve escondido?
Ungido é quem ainda ferve as mágoas no oceano?
Ano após ano em busca de um sempre que não anda?

também existe música na agulha riscando o final de um disco sem parar. aprendi a ouví-la ao me manter concentrado em tudo aquilo que não importa. consciente da existência daquilo que não precisa ser notado. aprendi a fazer-me presente assim, ocupando os espaços de minha mente entre jogos bobos com o indiferente e viagens de ônibus por uma copacabana engarrafada. tentar prever o plano de vôo da fumaça que sobe do café; replicar com a caneta no papel o caminho do pingo do suor do copo gelado de cerveja a escorrer pela borda; sorrir para o moço do ônibus vizinho. nadas que fazem com que as palavras em minha cabeça se calem. nadas que falam comigo e me ensinam lições sobre ser vão. a fumaça se desfaz, o pingo seca ou cai, eu sigo. meus pensamentos silenciam nas mortes dos nadas e, como se servindo de alimento, deixam ressurgir palavras que foram ditas em épocas que também já viraram nada. palavras desesperadas como as propagandas de vendedores de peixe em final de feira. eu sigo para aprender que a inércia do vazio da vida é onde escuto o barulho que me basta. o barulho que invento.
Morar num hotel é uma experiência singular. Você acorda, atrasada sempre. Culpa os 34 episódios de Simpsons que a Fox insiste em passar todas as noites, um documentário bizarro de qualquer canal ou todos aqueles filmes ruins que você só se permite assistir sozinha. Sozinha ou com os fantasmas que te fazem companhia. Seja qual o motivo, não se dorme bem. A cama é confortável, tem o ar condicionado moderno, janelas a prova de som e cortinas que bloqueiam até mesmo a claridade das ideias. Mas algo nessa imensidão branca, construída perfeitamente para praticidade e repouso, é desconfortante. Penso num cigarro e não se pode. Desejo uma cerveja e me nego abrir o frigobar. Permito-me sentir fome e toda vontade passa ao lembrar do tédio dos restaurantes. Convenço-me finalmente a sair. Um vestido bonito, cabelos soltos, maquiagem leve e estou pronta. Puxo as cortinas e vejo somente a chuva sob a fila de carros que atolam as ruas. Me desanimo uma outra vez. Envio mensagens, reviro e-mail, refaço a mala e desisto. Me entrego a branquidão do quarto e me permito escutá-los, eles, os amigos fantasmas. Um diz ter seu nome. Na minha mente, a voz tem seu sotaque. Discutimos. Rimos. Se aninha ao meu lado enquanto abraço o travesseiro e tento dormir. Outros fantasmas aparecem e tentam ocupar o mesmo espaço. Dos principais, três. Todos comigo. E ninguém ao lado. Assumem diversos formatos, sentimentos e sonoridades Mas sempre no mesmo tom: branco. Pálido. Tal qual como o quarto.