giroflex


de onde eu vim, sirenes sempre precederam desgraças. eram cortes abruptos na rotina bucólica dos pássaros cantando.

enquanto tomo um café em meio aos zumbidos dos automóveis em uma lanchonete qualquer, novamente escuto as sirenes. carros sobem em desespero a avenida engarrafada por mais uma vez. em mim, cresce uma aflição não familiar a medida que o som aumenta somente por querer saber o que motivou aquele alarde sobre rodas. enquanto isso, o rapaz do outro lado do balcão continua comendo o seu pf ouvindo o garçom o entreter com gozações de futebol. os dois sorriem. minha mão começa a suar; minha cabeça se perde imaginando consequências nefastas para aquele chamado. um motoboy tomba em mais uma marginal ficando gravemente ferido. uma senhora sofre um infarto após uma tentativa de assalto bem-sucedida nos jardins. mais uma favela, curiosamente perto do brooklyn, pega fogo. explodiram um caixa eletrônico num banco da zona norte. tudo isso me vem a mente, enquanto o rapaz ao lado degusta um belo gole de coca-cola. respiro pausadamente e tomo um sofrido gole do café já frio. percebo, então, a natureza da indiferença que o fez sequer notar a passagem de todo o barulho há pouco. ele se sente em paz. de certa forma, o invejo e compreendo um pouco melhor esta cidade e suas sirenes. aqui, elas não precedem desgraças. as daqui nos condicionam auditivamente a reproduzir a sensação da segurança contida no concreto. a segurança branca, classe-média ordeira e masculina do concreto. aqui as sirenes são lembretes que nos mostram que a cidade-fábrica continua a operar corretamente para quem aceita com ignorância a sua própria condição. a ignorância de achar que um rosto desconhecido, automaticamente, deixa de representar um rosto; de que um bairro que nunca visitado não representa o conceito lar; de se pensar indivualmente um indíviduio.

as sirenes daqui são como os mosquitos que não nos deixam dormir: lutamos contra ou então cubrimos a cabeça com a ilusão do lençol.

Koan do masoquismo

Se você aceita tudo como alegria você é um masoquista
Se você aceita tudo como sofrimento você é um masoquista
Talvez o problema sejam as lentes

Como falar com crianças

Não percebia isso faz tempo,
Talvez me entregando ao inautêntico
mas agora claro e simples
aprendi como falar com o outro
como se fosse a mim

Que para se relacionar puramente
com outro ser humano
não basta simplesmente falar com a pessoa de agora
mas com a criança dentro dela,
para aquilo que ela era e ainda é
apesar das formas

É isso que os santos dizem ser
Deus em voce

Assim é possível que se haja amor puro
sem julgamentos
Onde os sentimentos vivem puros
sem escuro

sem a influência do meio

O fundo é foda

  

éter

na beirada do mundo
eu te vi
invisível
para os métodos científicos

quintessência presente
na dança dos planetas
nos micro espaços das migalhas de pão
sob o umbral desta porta
nos desejando

boa viagem
para o meu universo