a ausência mora nos detalhes
ligar o ar condicionado
fechar as cortinas
apagar as luzes
nessa rotina de toda noite
a ausência já fez moradia
própria
o tudo que persistiu
esse espólio de guerra
dentro de casa
é assinado pela tua falta
menos essa camisa nova
que precisei comprar
quando estraguei a que me deste
lavando-a com água sanitária
no tanque da cozinha
coleto provas de que hoje estou
vivo
essa dor no corpo
de atleta das madrugadas
esse carpete na língua
borrado das cinzas do cigarro barato
são evidências de que aqui
nesse espaço-tempo
separando a cama do banheiro
ainda existo
ainda que apático
sobrevivo
existo
zonzo com a obrigação
de começar a semana
de novo
sem seus óculos
sem meu engov
A solidão é expurgada
pelas suas unhas
cravo a cravo
espremido das minhas costas
por fim limpa.
- Doeu?
você ouviu meus passos
ecoando atrás dos seus
saiu correndo
fechou a porta
abriu seu mundo
com as melancólicas vozes
do seu antigo toca-discos
cantando
ouvi sua voz abrir suas portas
mas desculpa
se meus passos
ressoavam vazios
nas escadas
indo embora
eles corriam de volta pra casa
pra abrir a janela
e fazer
das suas vozes
o hino
das suas terras
no meu mundo
ressonante.
minha velocidade é constante:
três decepções
amorosas ou não
por hora