seis horas de solidão

    são mais do que suficientes
    pra mudar a vida de alguém

    pra criar ou apagar
    apertos no peito

    acelerar o coração
    dilatar as pupilas

    escrever um livro
    e sorrir

como um beijo em um quarto escuro

o tempo sempre acaba, transitando
entre cada comprimisso
      cada calendário

      como se mudanças previstas fossem as mais importantes

palavras de outro alguém ou tudo que poderia ter sido diferente e não importa mais

que diferença irá fazer
se eu deixar este caderno aqui?
bem aqui, junto a este brownie mordido?

que diferença? e o celular,
e a mochila?
e as roupas que visto?

e uma mensagem de amor em português?

que diferença pra alguém
    além de mim?

e se eu mudar o título
    da minha vida
    e escrever esta mensagem secreta
    como epitáfio?

sobre o caos

me dá raiva essa despreocupação das pessoas daqui. desfilam, todas lindas, em jardins floridos, às onze da manhã, como se viver assim fosse natural. e é, para elas é. não há mágoa, não há bala perdida,
e os que trabalham, fazem isso como se fosse uma parte agradável de suas vidas. e é, para eles é.
e é assim com a comida, e com a música, e, quem diria, até com os turistas.

isso me deixa triste.

não por inveja, mas pelo exato oposto. onde está o pagode alto na esquina? onde está a preocupação com o que você tem, que te é precioso, que pode ser tomado de você?
onde está a ignorância cultural e as grandes descobertas constantes? as novas músicas, as novas amizades, os novos carinhos? onde está o incômodo?
daqui, só vejo raiva desnecessária e imediatamente contida por causa da mulher que passou seu lugar na fila, ou o descontentamento de não ter wifi grátis no café.

não me impressiona esse país ser tão frio.

terra de ninguém

não me pertenço aqui
na verdade, nem lá fora eu me pertenço
nem àquela loira linda que
    passou de bicicleta

porque todo pertencer se perde
em um surto de realidade
que destrói, por um momento
    meu encantamento