criar não é uma arte,
é uma consequência.
queria poder ser criativo
como as tantas estrelas que admiro durante a noite
mas dedico minha vida a lutar contra a gravidade
a carência
da minha situação
que me diz que
em vez de pó de estrelas
sou uma singularidade
sem som, nem luz
que me dê cor ou sentido, não
sou um ponto nesse inefável céu
abraçado ao vazio e a sua imensidão
tenho dificuldades de sentir meus pés na terra
ela é árida demais
de sentimento
ela é úmida demais
de tesão e castidade
no mundo em que estou, nesse, dos outros,
nada me apetece
nem vênus
nem marte
mesmo assim eu
sinto fome
de carne fresca
de suores noturnos
meu corpo não consegue conceber
a eternidade do espaço
e não se conforma com sua prisão
entre duas tão diferentes órbitas
buscar constantemente
a felicidade me cansa
despido
deixo minha armadura e
me banho em seu rio de águas mornas
sem vontade e coragem de sair
o dia me despe
de suas luzes
sob as estrelas
ribeirinhas
as sombras me curam da compulsão
da busca por seu calor solar
nunca precisei buscar
o frio
agasalhado
corre em minhas veias
alheio às marés e suas luas
constante como uma chama
eterno quanto a galáxia
minha carcaça é quente
como a de vocês
a explicação pro suor dessa cidade
pro calor da sua voz
pra frieza do meu coração.
me vulgarizo com uma facilidade irremediável.
faz pouco tempo que olho pra trás
e me vejo livre
a liberdade plena e corruptora
a liberdade que permite que eu me dê pesadelos
que eu orquestre o presente com o único intuito de que ele se torne passado
que eu esqueça desse alguém
- capitão? co-piloto? computador de bordo? -
que vive por mim
esse cientista
que vive por mim
a liberdade que não me abraça para não me prender.
amarro minhas mãos
e me jogo
ao precipício