Textos de Bernardo

farsas daquele dia escuro

na face
do dado
o número
pelo acaso
guardado

na face
do rosto
o futuro
pelo tapa
imposto

em face
ao susto
a solidão
de um orgulho
robusto

na face
do dado
o caminho
pela sorte
trilhado

fim da fase
    das farsas
    dos tapas

nossos gritos

todo o barulho
antes do estilhaçar
do copo
contra a parede

    todo esse barulho
  gritando
    para nós
  calados

o estridente grito
abafado pela água
a escorrer
muda

súplica do copo
  pela vida
    nossas vidas

a preguiça de ter de limpar
  o que há de ficar pelo chão
    quando nos calarmos
por fim

melancolia

ando sentimental
em tudo o que há
    ausência

o tombo da criança
a voz de Cazuza sozinha
um peito vazado na noite
porta-retratos vazios

de tudo que é vivo
ninguém há de me entender
ou brincar de psicólogo

exceto as gaivotas
  flertando com o mar
    os ventos fortes do mar
  mas eternas
amantes ternas da terra firme

evolução

hoje me despedi
do grande elefante branco
agarrei suas orelhas
abracei seu pescoço e
desfilamos pela avenida
acenando para a vida
pessoas a esperar o ônibus
não entenderam nada
vendo-me cair de costas
quebrar duas costelas e
por fim me por a chorar
de tanto gargalhar
ao perceber que no chão
só havia um pouco mais
de chão
de nada mais

conviver comigo

a glória da minha maturidade chega tão cheia de
nada mais que o jeans em cima da cama
o resto do cigarro no cinzeiro sujo
música alta com dança lenta
banheiro de porta aberta
o lado da cama
vazio
e eu
.