Minha caneta é pincel;
as palavras, as cores...
Versos são os seus castanhos
largados nesses fios do seu cabelo
por entre os olhos que me cegam.
Essa estrofe é sua pele bege
cadenciada pro moreno
espalhada pelo seu corpo:
escura
onde eu posso ver;
clara
onde eu queria poder ver.
Poemas se resumem em sua boca
que articula e expõe seu portão
livrando o não e trancafiando a saudade.
Poemas pintados de vermelho
se misturam em pontuação mal feita:
por vezes ponto final.
por vezes reticências...
O vermelho viabiliza o meu salto
irresponsável
flutuando com a ajuda dessa cor quente
assassinando a distância
entre a minha
e a sua
boca.
um dia quero escrever pequeno.
menos.
fugir do desespero de ser eu.
mais.
Sobrevivo em som.
Crio eco no espaço
buscando brechas
comumente chamadas de ouvidos.
Reverbero nos agudos e graves:
a vida sobre a vida;
o dilema da vida,
a vontade do acorde perfeito
e a preguiça de uma nota solta.
Os ruídos são ondas dos outros,
decompondo,
sobrepondo,
tentando anular minha própra frequência,
muito bem definida por padrão.
Minha casa é um lá menor,
simples,
agradável
e que cabe na mão de qualquer criança.
Dentro dela existem somente seus microtons;
no linguajar popular,
poemas e fotos de minhas saudades.
Eles não sabem,
mas também são músicas...
Elas não sabem,
mas são elas que partem pelo ar...
Eles não sabem,
eles simplesmente não sabem,
que não são eles que decoram
o que costumo chamar de lar...
Elas não sabem,
mas eu mesmo navego por elas...
Um a um,
uma a uma,
até chegar ao pé do seu ouvido
em tom maior.
de novo
Eu,
nuvem que se desfaz,
em gotas prestes a cair,
em vapores a se confundir,
em granizos a se fundir.
No fim, tudo que não é ar
se vai.
A queda,
o salto
no abismo entre o céu e o chão.
O abismo entre nós.
Menor
Menor
Menor
A gravidade acelerando
toda a água que sou
em direção ao seu corpo
de mãos dadas a outro corpo.
Cabelo e vestido molhados
sorriso de boca aberta para os céus
pronta para me receber
sem nem me perceber
tocar a ponta do seu nariz
e me espalhar em outras gotas
por você.
Tudo que restou foi jogado fora.
Nós parados e sorrindo,
as notas e os nossos sons,
as letras e declarações trocadas,
não estão mais aqui para serem
guia rápido e atalho para saudades.
Tudo, tudo foi jogado fora.
Exceto sua escova de dentes.
Ao contrário do resto,
sua escova é um totem,
um bastião do seu nome.
Ela não é só um instantâneo de um passado,
ela é o grito por sua presença...
Sua escova tem vontades próprias
e essas vontates não me permitem perdê-la.
Ela continua lá:
no mesmo pote,
com a mesma caixinha,
a espreita,
espiando o movimento do abrir e fechar
da porta do meu banheiro.
Sua escova guarda nossas memórias...
Sua escova tem o sonho da volta...
E no sonho dela, você a segura,
coloca a pasta,
esfrega com força e rapidez contra os dentes
logo após um café corrido
colocado entre o "bom dia"
e o atraso pro seu trabalho.