Textos de Bernardo

Solidão e Solitário

Certas verdades
  só se descobre caminhando
    numa calçada da Lapa
      no meio de travestis
        às cinco e trinta da manhã
          de uma terça-feira de carnaval
            com um cigarro entre os dedos.

Num caminho
  só e
teu
            com um cigarro entre os dedos.

Certas verdades
só aprendemos
quando nos vemos
            com um marlboro vermelho entre os dedos
com nada no coração.

Lucky Strike

Por entre os dedos finos
sobe essa fumaça densa
do cigarro que anuncia o porvir.

Essa onda cinza e oscilante
que ruma ao limite do céu
para tornar turva e confusa
qualquer troca de olhares.

Contidas, semi declarações
desenhadas e compreendidas
pelo fugaz desejo
de gerar mais fumaça
que assina o que vem depois.

quarta-feira de cinzas

o homem do saco
roubou
toda minha vontade de conhecer
o mundo
agradeci-o com um café
ainda com a lembrança
dos teus olhos fortes

devia ter ouvido minha avó sobre
os casacos
atentado para suas crenças e folclores
perigos e alertas
sobre o homem do saco
e essas mulheres
munidas de olhares fortes

Hortinha

Escrevi teu nome
num grão de arroz.
Plantei teu nome
no pote de algodão,
juntinho do meu
num grão de feijão
para vingarmos juntos,
saciar essa fome
grande da saudade
de sermos nós mesmos.

ansiolítico

para toda a pressão
do por vir
dessa manhã escura
sem vontade
brincas com pílulas
de conversas
prometes tua imagem
bem borrada
entre um café e outro
pão na chapa